A Fome de Bengala
Durante a Segunda Guerra Mundial, a região de Bengala, território localizado entre Índia e Bangladesh, era uma possessão do Império Britânico. A principal base de alimentação dos habitantes de Bengala era o arroz, que se tornava cada vez mais caro e inacessível devido a uma conjunção de fatores. Em 1942, a safra de arroz de Bengala havia sido duramente afetada por uma inundação causada por um ciclone. Paralelamente, a invasão da colônia britânica de Burma pelos japoneses havia travado o transporte de arroz para a Índia.
Dessa forma, sem poder contar com sua safra, a população de Bengala passou a depender dos seus estoques de arroz e da importação de trigo para se alimentar em 1943. O primeiro ministro do Reino Unido, Winston Churchill, entretanto, tinha outros planos. O premier britânico recusou os pedidos dos indianos para envio de trigo, preferindo encaminhar o produto para seus aliados europeus, ao mesmo tempo em que ordenou que os produtores de Bengala enviassem seus estoques de arroz para que a coroa britânica os distribuísse para suas tropas estacionadas na Grécia, no Egito e no Oriente Médio.
Churchill foi alertado de que tal procedimento poderia gerar uma catástrofe na Índia, mas ignorou. O primeiro ministro nunca escondeu sua crença na "supremacia da raça branca" e o fato de que odiava os indianos, considerando-os uma "raça inferior". Novamente informado de que Bengala passaria fome, Churchill disse que se tal fato ocorresse, a culpa era dos indianos que "se reproduzem como coelhos".
Os indianos iniciaram uma série de protestos e rebeliões, mas foram rapidamente reprimidos. Os altos membros do partido do Congresso Indiano, que exigiam a independência da colônia, foram presos, incluindo os pacifistas Mahatma Gandhi e Jawaharlal Nehru. Os soldados britânicos executaram 2500 pessoas e prenderam outras 66 mil.
Com o fim dos alimentos, a fome se alastrou por Bengala. Centenas de milhares de famílias inteiras pereciam dentro de suas casas, enquanto outras tantas definhavam nas ruas, morrendo em via pública, à vista de todo mundo. Pouco a pouco, as aldeias e cidades ficaram cheias de cadáveres em decomposição, não recolhidos. Tal fato agravou a situação, com a disseminação de doenças como cólera, tifo e disenteria que se expandiram sem controle, ceifando outras milhares de vida. Ao todo, quatro milhões de indianos morreram vitimados pela Grande Fome de Bengala. Quando o secretário geral da Índia, Leo Amary, fez mais um apelo para que Churchill liberasse comida para Bengala, o premier britânico o interpelou questionando: "se os alimentos são tão escassos, por que Gandhi não morreu ainda?"
Apesar disso, Churchill, em oposição a Hitler, não foi afetado com a fama de grande genocida ou confrontado com as consequências desastrosas de suas ações. Ao contrário. Foi heroicizado por filmes de Hollywood, incensado pela imprensa ocidental, eleito "o maior britânico do século XX" e ganhou até um Prêmio Nobel. Churchill parecia ter consciência de que sua fortuna historiográfica seria positiva. Costumava repetir: "a história será gentil comigo, porque eu mesmo pretendo escrevê-la". Ele tinha razão.
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