Guerra do Vietnã (VI)

Considerado um dos mais sangrentos conflitos tributários da Guerra Fria, a Guerra do Vietnã teve início em 1º de novembro de 1955, a princípio como uma disputa civil travada pela unificação do Vietnã. Não obstante, a guerra ganhou dimensão internacional após a intervenção aberta e em larga escala dos Estados Unidos, visando impedir a consolidação de um governo socialista no Sudeste Asiático. O conflito se estendeu ao Vietnã do Norte, Camboja e Laos, prolongando-se por 20 anos e deixando um saldo de mais de 3,5 milhões de mortos.

As origens do conflito remontam à Segunda Guerra Mundial, quando, sob a liderança do revolucionário marxista Ho Chi Minh, a Liga pela Independência do Vietnã (Viet Minh) conseguiu expulsar as tropas japonesas que haviam invadido a região. Em 1946, os revolucionários vietnamitas passaram a combater o governo colonial francês, derrotando suas forças na Batalha de Dien Bien Phu, em 1954. O ato final da Conferência de Genebra reconheceu a autonomia política vietnamita e a legitimidade do governo do Viet Minh nas províncias do norte, mas determinou a divisão do país ao meio, ao longo do Paralelo 17, autorizando que os grupos anticomunistas se instalassem ao sul. Um futuro referendo para a reunificação do país foi agendado para 1956.

Surgiram assim dois novos Estados. Nas províncias setentrionais, foi instaurada a República Democrática do Vietnã (ou Vietnã do Norte) — um governo socialista, presidido por Ho Chi Minh e apoiado pela União Soviética e pela China. Na porção meridional, foi criado  o Vietnã do Sul, um Estado imperial com economia de mercado, aliado aos Estados Unidos e demais potências capitalistas ocidentais. O governo revolucionário do Vietnã do Norte iniciou uma série de transformações econômicas e sociais, incluindo a nacionalização de indústrias e a instituição da reforma agrária. Já no Vietnã do Sul, o ditador Ngo Dinh Diem depôs o imperador Bao Dai, consolidando um regime autoritário e repressivo. Diem ordenou o massacre dos comunistas e a eliminação física de toda a oposição política ao seu governo. Ciente de que a população sul-vietnamita era majoritariamente favorável aos revolucionários do norte, Diem determinou o cancelamento do referendo sobre a unificação do país. Os norte-vietnamitas responderam incentivando a insurgência popular no Vietnã do Sul.

As provocações e estratégias de desestabilização mútuas evoluíram para tentativas abertas de imposição do regime político e econômico. Os dois países passaram à ação militar ainda em 1955. Alarmados com a possibilidade de unificação do Vietnã sob o governo revolucionário do norte e com a expansão do bloco socialista no Sudeste Asiático (como preconizado pela "Teoria do Dominó"), o governo dos Estados Unidos passou a fornecer apoio financeiro, técnico e militar ao Vietnã do Sul. Os estadunidenses seguiram apoiando o governo sul-vietnamita mesmo após a deposição de Diem, derrubado em um golpe militar em 1963. O país atravessaria um período de instabilidade política até que Nguyen Van Thieu chegasse à presidência.

Lideradas por Ho Chi Minh e Vo Nguyen Giap, as forças norte-vietnamitas empreendiam operações de enfrentamento aberto com tropas regulares, ao passo que a Frente Nacional para a Libertação do Vietnã (FNL, ou "Viet Cong") conduzia enfrentamento de guerrilha contra os combatentes sul-vietnamitas em seu próprio território. À medida em que o conflito progredia, o Vietnã do Norte passou a centralizar os esforços nas operações convencionais, mas o apoio militar e financeiro dos Estados Unidos ao Vietnã do Sul conferia maior poder de fogo às tropas adversárias, transformando a disputa em um conflito encarniçado.

Diante da resistência norte-vietnamita, o governo dos Estados Unidos decidiu intervir diretamente no conflito em favor do Vietnã do Sul, enviando tropas regulares com centenas de milhares de homens e intensificando o apoio material. Entre 1960 e 1961, os Estados Unidos triplicaram o número de tropas ativas no Vietnã do Sul e passaram a conduzir campanhas sistemáticas de bombardeio estratégico contra as cidades do Vietnã do Norte, causando enorme devastação. Para tentar forçar a rendição norte-vietnamita, os Estados Unidos empregaram extrema violência em incursões terrestres e ataques aéreos contra alvos civis, fazendo uso generalizado de armas químicas como napalm, fósforo branco e agente laranja, afetando gravemente a capacidade produtiva do país.

Em 1964, os Estados Unidos realizaram uma operação de bandeira falsa que visava responsabilizar embarcações norte-vietnamitas pelo ataque a um contratorpedeiro estadunidense durante o chamado Incidente do Golfo de Tonkin. A operação serviu de base para que o Congresso dos Estados Unidos aprovasse uma resolução autorizando o presidente Lyndon Johnson a ampliar exponencialmente as ações dos Estados Unidos no conflito. As tropas estadunidenses no Vietnã do Sul receberam um reforço de quase 600 mil soldados — elevando o efetivo total dos Estados Unidos no conflito a 2,7 milhões de soldados. A guerra terrestre foi intensificada durante o processo chamado "escalada" e os ataques aéreos se tornaram ainda mais violentos. O conflito se expandiu para além das fronteiras vietnamitas, atingindo também o Laos e o Camboja, que se tornaram alvos da Força Aérea dos Estados Unidos.

Em janeiro de 1968, as tropas regulares do Vietnã do Norte e os guerrilheiros "vietcongues" do FNL lançaram a Ofensiva do Tet — uma série de ataques massivos contra as principais cidades do Vietnã do Sul, incluindo a capital Saigon, visando incitar a população a um levante contra o governo sul-vietnamita e contra os ocupantes estadunidenses. A ofensiva foi taticamente derrotada, mas provocou forte impacto na avaliação do conflito, minando a confiança na estratégia militar dos Estados Unidos e levantando questionamentos sobre os custos de uma eventual vitória. O elevado número de baixas e a divulgação dos efeitos da guerra, do uso de armas químicas e das atrocidades e massacres perpetrados pelos soldados estadunidenses contra a população civil vietnamita — nomeadamente o repulsivo Massacre de My Lai — causaram enorme desconforto na opinião pública dos Estados Unidos e ensejaram protestos internacionais exigindo o fim do conflito.

Richard Nixon, sucessor de Lyndon Johnson, iniciou o processo de "vietnamização" da guerra, investindo no aumento da capacidade militar das forças regulares do Vietnã do Sul, em paralelo com a redução gradual da presença das tropas estadunidenses. Buscava, dessa forma, transferir a responsabilidade pelas operações militares às tropas sul-vietnamitas, sem comprometer o objetivo de impedir a expansão do socialismo no Sudeste Asiático. Com quase 60 mil soldados mortos e pressionado pelas críticas e abordagens da imprensa internacional, Nixon concluiu que o custo do conflito se tornara muito alto e que não conseguiria obter a vitória sem derramamento contínuo de sangue de suas tropas. Assim, no início dos anos setenta, emissários da Casa Branca iniciaram as conversações por um cessar-fogo.

Em janeiro de 1973, durante os Acordos de Paz de Paris, Nixon cedeu à assinatura de um armistício, concordando em encerrar a guerra mesmo sem conseguir atingir nenhum de seus objetivos. No ano seguinte, os Estados Unidos aceleraram a retirada de suas tropas e abandonaram o apoio formal ao governo de Nguyen Van Thieu. Em março de 1975, os norte-vietnamitas iniciaram uma grande ofensiva final. As províncias sulistas de Quang Tri, Da Nang e Thua Thien-Hue foram entregues sem resistência e Thieu abandonou a presidência, deixando o general Duong Van Minh em seu lugar. Em 30 de abril de 1975, as forças revolucionárias ocuparam Saigon, expulsando as tropas estrangeiras remanescentes e unificando o país sob o governo socialista de Hanói. O pequeno Vietnã do Norte entrava para a história como a nação que havia imposto à maior potência bélica do mundo uma derrota militar sem precedentes.


Um ataque de napalm perpetrado pela Força Aérea dos Estados Unidos irrompe em uma bola de fogo, sob olhares de soldados estadunidenses em patrulha. Vietnã do Sul, 1966.



Helicópteros do Exército dos Estados Unidos disparam tiros de metralhadora contra uma linha de árvores para cobrir o avanço das tropas terrestres sul-vietnamitas em um ataque contra um acampamento vietcongue nos arredores de Tay Ninh, na fronteira com o Camboja, em março de 1965.



A Força Aérea dos EUA ataca um acampamento vietcongue com uma bomba de fósforo branco em 1966.



Mulheres e crianças vietnamitas agacham-se em um canal lamacento para se protegerem de um bombardeio estadunidense em Bao Trai, em 1º de janeiro de 1966.



Civis vietnamitas feridos e em estado de choque em Dong Xoai, em 6 de junho de 1965.



Um bombardeiro B-52 da Força Aérea dos Estados Unidos lança bombas contra alvos vietcongues nos arredores de Tay Ninh, em 2 de novembro de 1965.

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