A fundação do Partido dos Trabalhadores
Luiz Inácio Lula da Silva presidindo o ato de fundação do Partido dos Trabalhadores (PT). O partido foi fundado em 10 de fevereiro de 1980, em uma cerimônia realizada no auditório do Colégio Sion, em São Paulo.
A fundação do Partido dos Trabalhadores resultou da rearticulação do campo progressista durante a abertura política dos anos setenta. Após os chamados "anos de chumbo" — período mais repressivo da ditadura, marcado pela suspensão de direitos civis, coerção dos movimentos sociais, tortura e assassinato dos opositores do regime —, os generais Geisel e Figueiredo adotaram um processo gradual de distensão das medidas restritivas, revogando a censura prévia do órgãos de comunicação, promulgando a anistia política e abolindo o bipartidarismo. Paralelamente ao processo de distensão, o ciclo de crescimento chamado "milagre econômico" havia se encerrado, sendo seguido pelo aumento da inflação, do desemprego e do custo de vida, gerando grande insatisfação nas classes operárias urbanas.
Desarticulado durante os "anos de chumbo", o movimento operário encontrou um ambiente propício para sua restauração e deu origem ao chamado "Novo Sindicalismo". O movimento ganhou força a partir das greves de 1978 no ABC Paulista, lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema. As greves dos metalúrgicos se tornaram o principal núcleo de oposição à ditadura militar, angariando apoio de vastos setores da sociedade. Durante o 3° Congresso dos Trabalhadores Metalúrgicos em 1978, Lula argumentou sobre a necessidade de criação de uma nova legenda para que os trabalhadores elegessem seus próprios representantes para o Congresso Nacional. Os metalúrgicos iniciaram então uma campanha para coleta de assinaturas. Em outubro de 1979, foi criada a Comissão Nacional Provisória do Movimento Pró-PT, coordenada por Jacó Bittar e formada principalmente por dirigentes sindicais, tais como Olívio Dutra, Manuel da Conceição e Luiz Dulci.
No dia 10 de fevereiro de 1980, organizou-se o ato de fundação do Partido dos Trabalhadores no auditório do Colégio Sion, em São Paulo. O PT foi a primeira legenda organizada no país após a reforma partidária que aboliu o bipartidarismo. Representantes de mais de 400 organizações sindicais e movimentos sociais de 17 estados participaram do ato de fundação. A primeira ficha de filiação foi assinada por Apolônio de Carvalho, militante comunista que integrou as Brigadas Internacionais contra o fascismo na Guerra Civil Espanhola e lutou contra as tropas nazistas na Resistência Francesa. Além dos sindicatos e movimentos sociais, o partido atraiu apoio dos ativistas das Comunidades Eclesiais de Base, das lideranças católicas ligadas à Teologia da Libertação, de ex-militantes das organizações revolucionárias, do movimento estudantil e de artistas e intelectuais como Sérgio Buarque de Hollanda, Mário Pedrosa e Antonio Candido.
O partido era subdivido em diversas correntes de pensamento, embora predominassem os defensores da "construção do socialismo democrático", que pregavam a necessidade de reformular o modelo de gestão do socialismo real ao mesmo tempo em que se opunham às correntes sociais-democratas que, nos dizeres do manifesto de fundação do partido, "não apresentam nenhuma perspectiva real de superação histórica do capitalismo imperialista". O manifesto do partido ressaltava que a organização surgiu "da necessidade sentida por milhões de trabalhadores brasileiros de intervir na vida social e política do país para transformá-la", propondo romper com as lideranças do sindicalismo oficial e mobilizar a classe trabalhadora em prol da construção de “uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores”.
O rápido crescimento da legenda surpreendeu os militares, que até então duvidavam da viabilidade de um partido estruturado em bases populares. Também surpreendeu as lideranças progressistas ligadas ao antigo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que declaravam a preferência pela criação de um partido de base social-democrata. Em 1982, o partido elegeu oito deputados federais e fez seu primeiro prefeito — o ferramenteiro Gilson Menezes, que venceu a disputa pelo comando da cidade de Diadema, na Grande São Paulo. No ano seguinte, o PT participou da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), então a maior confederação sindical do país, reunindo 912 entidades que congregavam mais de 12 milhões de trabalhadores.
Ao lado do MDB e do Partido Democrático Trabalhista (PDT), o PT foi um dos principais articuladores do movimento social conhecido como "Diretas Já", que reivindicava abertura política completa e eleições diretas para a Presidência da República. Em São Paulo, um dos comícios das Diretas Já mobilizou um público de mais de 300 mil pessoas no centro da cidade. A emenda constitucional para eleição direta, entretanto, foi derrotada na Câmara dos Deputados e o processo de reabertura somente seria consolidado após o mandato de José Sarney, que assumiu a presidência de forma indireta, substituindo Tancredo Neves, eleito pelo colégio eleitoral e falecido antes de tomar posse.
Em 1986, Lula foi eleito deputado federal com a maior votação da história até então. Com 16 deputados federais eleitos (incluindo Florestan Fernandes, Benedita da Silva, José Genoíno e Olívio Dutra), o PT participou da Assembleia Nacional Constituinte e auxiliou na elaboração de emendas para inclusão de pautas como igualdade de gênero, sufrágio irrestrito e universalização de direitos sociais como educação e saúde. Considerando que o texto estava aquém das reivindicações populares, a bancada do PT votou contra o texto final da Constituição de 1988, mas acabou por ratificá-la após aprovação em plenário. Nesse mesmo ano, o partido conquistou a gestão da maior cidade do país, elegendo Luiza Erundina como prefeita de São Paulo.
O PT lançou Lula como candidato ao pleito de 1989 — a primeira eleição direta para a Presidência da República desde a redemocratização. Lula chegou ao segundo turno, mas foi derrotado pelo candidato conservador Fernando Collor, egresso da ARENA e filiado ao Partido da Reconstrução Nacional (PRN). O PT elegeu, entretanto, Eduardo Suplicy, seu primeiro senador. Lula voltou a disputar a presidência pelo PT nas eleições de 1994 e 1998, perdendo nas duas ocasiões em primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Na eleição de 1994, o PT elegeu seus primeiros governadores — Vitor Buaiz, no Espírito Santo, e Cristovam Buarque, pelo Distrito Federal. A legenda seguiu crescendo ao longo da década, consolidando-se como maior partido de esquerda do país.
Com uma estratégia de moderação das pautas e suavização da retórica "radical", Lula venceu a eleição presidencial de 2002, derrotando o candidato tucano José Serra no segundo turno. Tornou-se, dessa forma, o primeiro presidente brasileiro oriundo da classe operária. Ainda durante a campanha, Lula comprometeu-se com uma política de compatibilização de interesses de classes, expressa na "carta ao povo brasileiro", asseverando que respeitaria os contratos nacionais e internacionais. Buscava, dessa forma, constituir uma ampla base de apoio político e assegurar a governabilidade, reunindo desde partidos de esquerda até legendas fisiológicas e agremiações de centro-direita. Também acenou positivamente para o mercado, buscando cooptar apoio de parte do empresariado.
A moderação das pautas e o esforço em prol da articulação política ampla desagradou vários setores da esquerda. Não obstante, Lula implementou uma série de programas sociais e políticas públicas que possibilitaram o aumento da renda média dos trabalhadores e permitiram a redução da pobreza e da desigualdade social em níveis inéditos. Durante o governo Lula, o Brasil reduziu a pobreza extrema em 75% e praticamente erradicou a fome crônica — o que rendeu ao mandatário o título de "campeão mundial do combate à fome". Reeleito em 2006, Lula implementou programas que permitiram quadruplicar o ingresso de jovens no ensino superior, ampliou os empregos formais, criou programas de acesso ao crédito, combateu o déficit habitacional e aumentou de forma expressiva os investimentos em saúde e educação. Paralelamente, o Brasil retomou o crescimento econômico e manteve o ambiente de estabilidade e baixa inflação. Registrando expansões médias do PIB de 4% ao ano, o Brasil se tornou a 6ª maior economia do mundo, consolidando-se como uma potência emergente. O país investiu fortemente nas relações diplomáticas Sul-Sul, buscando alicerçar sua autonomia e estreitar os laços com os governos não alinhados a Washington, além de ingressar na articulação de organizações alternativas aos sistemas financeiros ocidentais derivados dos Acordos de Bretton Woods — nomeadamente o grupo dos "BRICS".
Lula deixou o governo com as maiores taxas de aprovação da história, com 83% dos entrevistados avaliando sua gestão como ótima ou boa. A alta popularidade facilitou a eleição de Dilma Rousseff, que venceu o pleito de 2010, tornando-se a primeira mulher a assumir a presidência do Brasil. Dilma deu continuidade aos programas sociais de seu antecessor e ampliou os investimentos em infraestrutura e serviços públicos. Também conseguiu reduzir o desemprego para o menor patamar da história. A eclosão das manifestações de junho de 2013, os atos contra a organização da Copa do Mundo de 2014 e os protestos antigovernamentais após 2015, entretanto, tornaram-se fortes fatores de desestabilização política. Dilma foi reeleita por uma estreita vantagem no segundo turno da eleição de 2014, derrotando Aécio Neves, candidato do PSDB. Seu governo, entretanto, seria marcado pela crise financeira, instabilidade política e o boicote institucional da oposição e do poder legislativo, além da campanha de guerra jurídica movida por setores do judiciário no âmbito da Operação Lava Jato, articulados com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
Sem sustentação política, Dilma Rousseff seria deposta pelo golpe parlamentar de 2016. Em abril de 2018, Lula seria alvo de uma prisão política, justificada por meio de um processo comprovadamente viciado, conduzido em conluio entre o juiz Sérgio Moro e o promotor Deltan Dallagnol, com o objetivo de impedir sua participação no pleito presidencial. A forte campanha midiática antipetista, o ativismo do aparato jurídico-repressivo e o distanciamento das bases resultaram em profundo desgaste da imagem pública do partido, ocorrido em paralelo à ascensão da onda conservadora. Fernando Haddad, candidato do PT na eleição presidencial de 2018, foi derrotado no segundo turno por Jair Bolsonaro. Nas eleições de 2020, o PT não conseguiu eleger candidatos às prefeituras das capitais.
Detentor da maior bancada parlamentar na Câmara dos Deputados e amparado por um contingente de mais de dois milhões de filiados, a legenda permanece entre os maiores partidos de esquerda da América Latina. As sondagens mais recentes indicam que o PT começou a se recuperar do desgaste sofrido ao longo da última década. Em pesquisa divulgada pelo Datafolha em dezembro de 2021, o partido foi apontado como legenda preferida por 28% dos entrevistados — índice 14 vezes superior ao percentual do segundo colocado. O partido também foi a agremiação que registrou o maior crescimento absoluto em 2021, ganhando 62 mil novos filiados em um ano. Lula, por sua vez, recuperou seus direitos políticos após a anulação e posterior arquivamento dos processos viciados da Operação Lava Jato, e desponta como favorito para a eleição presidencial de 2022. Conforme o Datafolha, Lula segue apontado como o melhor presidente da história por 51% da população brasileira.
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