Mao Tsé-Tung e Enver Hoxha
Mao Tsé-Tung, presidente da República Popular da China, cumprimenta Enver Hoxha, primeiro-ministro da Albânia. Os dois líderes socialistas se encontraram em Pequim em 1956, antes de se tornarem desafetos em função de desentendimentos sobre a teoria e a prática da construção do socialismo.
Após o triunfo da Revolução Chinesa em 1949, Mao Tsé-Tung buscou consolidar o domínio político do Partido Comunista da China e cooptar apoio de setores-chaves da sociedade para o projeto de construção do socialismo. Um dos primeiros passos tomados por Mao Tsé-Tung foi estabelecer uma aliança política com os intelectuais, as classes médias e parte da burguesia progressista chinesa - em especial os comerciantes e mercadores. De forma semelhante à Nova Política Econômica, implementada por Lenin na primeira década de existência da União Soviética, o Partido Comunista da China buscava instrumentalizar o setor produtivo chinês para restaurar a economia arrasada por décadas de guerra civil.
O governo chinês nacionalizou a indústria de base e os setores vistos como estratégicos - tais como os bancos e as empresas de transporte. A iniciativa privada, entretanto, não foi banida. Setores inteiros da burguesia chinesa continuaram autorizados a explorar mão-de-obra e acumular capital, embora o governo chinês adotasse salvaguardas para impedir que cooptassem o poder político. A burguesia, asseverava Mao, deveria servir ao projeto revolucionário - não mais subordinar o Estado aos seus interesses. No campo, o governo chinês deu início ao processo de coletivização das terras, mas evitou repetir a estratégia de confrontação aberta adotada por Stalin contra os kulaks. A princípio, o governo chinês adotou um processo lento e gradual de coletivização voluntária, com pagamento de indenizações aos proprietários de terra, variáveis conforme a produtividade e o tamanho dos lotes. Uma década depois do início do programa, apenas 15% das famílias camponesas haviam aderido às cooperativas. Mao ordenou a aceleração do processo, mas recuou pouco tempo depois em função dos protestos dos camponeses.
Essas características do processo revolucionário chinês foram interpretadas por acadêmicos ocidentais como evidências de um outro tipo de organização política - nem socialista, nem capitalista. O filósofo britânico, Martin Cohen, por exemplo, definiu o maoísmo como uma mistura de "confucionismo e socialismo - uma espécie de terceira via entre o comunismo e o capitalismo". De forma semelhante, muitos socialistas defensores do purismo ideológico criticaram duramente a Revolução Chinesa. Mao Tsé-Tung era visto com desconfiança por altos funcionários da burocracia soviética e lideranças socialistas do Leste Europeu.
O crítico mais veemente da revolução chinesa foi o líder socialista da Albânia, Enver Hoxha. Na obra "Imperialismo e Revolução", Hoxha acusou o Partido Comunista da China de ser uma "agremiação revisionista" e rotulou o pensamento de Mao Tsé-Tung como profundamente "antimarxista". Para Hoxha, o maoísmo era incompatível com todos os princípios basilares do marxismo-leninismo. Segundo o líder albanês, o conceito maoísta de Nova Democracia não era mais do que "rejeição da luta de classes em favor do colaboracionismo". Hoxha acusou Mao Tsé-Tung de dar continuidade à exploração capitalista irrestrita e de colaborar com as elites para subjugar a população chinesa aos interesses do capital, além de utilizar-se de seu exército não como uma força revolucionária, mas como um instrumento de coerção de seu próprio povo.
Em um trecho de "Imperialismo e Revolução", Hoxha compara as medidas de Mao Tsé-Tung às práticas antirrevolucionárias e de conciliação de classes defendidas pelos sociais-democratas europeus, "típicas de regimes revisionistas". Diz Hoxha: "Segundo o pensamento de Mao Tsé-Tung, um novo regime democrático pode existir e o socialismo só pode ser construído com base na colaboração de todas as classes e de todos os partidos. Procurem o conceito de democracia socialista, de sistema político socialista, que se baseie na "coexistência de longo prazo e supervisão mútua" de todas as partes, e notem que é muito parecido com o que pregam atualmente os italianos, os franceses, os espanhóis e outros revisionistas. É uma negação aberta do papel indispensável de um partido marxista-leninista na revolução e na construção do socialismo. A experiência histórica já provou que a ditadura do proletariado não pode existir e o socialismo não pode ser construído e defendido sem o papel de liderança indivisível de um partido marxista-leninista."
Hoxha governou a Albânia até 1985. Seu sucessor, Ramiz Alia, conduziu as reformas de abertura política e transição para a economia de mercado, dissolvendo o governo socialista e colaborando ativamente para ascensão das forças anticomunistas. O país passou a ser governado por uma aliança liberal-conservadora, centrada no Partido Democrático da Albânia. O governo albanês adotou medidas profundamente liberalizantes, privatização e cortes nos investimentos públicos que causaram uma crise econômica sem precedentes, jogando um terço da população na miséria e transformando o país num dos mais pobres da Europa. No outro extremo, o governo da China, um dos poucos que sobreviveram à onda de dissolução dos regimes socialistas no fim dos anos oitenta, segue dando continuidade às reformas iniciadas desde 1949, retirando quase um bilhão de pessoas da pobreza em sete décadas. Em 2020, o país anunciou publicamente a erradicação da miséria em todo o território chinês.
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