O beijo socialista
O beijo fraternal socialista é uma forma especial de saudação utilizada na União Soviética e nos países do Leste Europeu desde a consolidação da Revolução de Outubro de 1917. O cumprimento consiste em um abraço seguido por três beijos alternados nas bochechas. Quando as pessoas se cumprimentando eram próximas, era comum que o terceiro beijo fosse dado na boca.
O costume russo de cumprimentar as pessoas com três beijos nas bochechas antecede em séculos a formação da União Soviética, remontando às tradições rituais da Igreja Ortodoxa nos primórdios do Czarado da Rússia. O cumprimento era então uma alusão à Santíssima Trindade. O costume foi retomado pelo movimento operário russo no fim do século XIX, em contraposição ao hábito imposto pelo regime czarista, onde os súditos e subalternos tinham a obrigação de beijar as mãos dos nobres e dos aristocratas. Igualando o gestual dos cumprimentantes, a saudação operária tornou-se um símbolo de igualdade, fraternidade e solidariedade, sendo incorporada às normas comportamentais dos revolucionários bolcheviques e utilizada como uma expressão de unidade da classe proletária.
Após a Revolução de Outubro, consolidou-se a ritualização do gesto, que se tornou uma saudação protocolar entre os membros do governo soviético - ainda que a adesão não fosse consensual. O gesto simbólico da camaradagem e solidariedade socialista foi exportado para outros países através da Internacional Comunista, popularizando-se sobretudo no Leste Europeu. Mais reservados, os socialistas dos países asiáticos adotaram uma versão diferenciada, substituindo os três beijos por três abraços. Cuba, por sua vez, adotou o costume dos três beijos nas bochechas, mas aboliu o beijo na boca, imbuído de significado erótico-amoroso no mundo ocidental. A saudação foi adotada por outros líderes socialistas do Terceiro Mundo e por movimentos autonomistas alinhados ao ideário socialista, tais como a Organização para a Libertação da Palestina e o Congresso Nacional Africano.
Na União Soviética, a intensidade do cumprimento fraternal servia como um indicativo do grau de alinhamento e de comprometimento entre as lideranças. A omissão do cumprimento, costumava significar que as relações com um outro país estavam estremecidas - caso notável, por exemplo, na ausência dos abraços, beijos e mesmo do uso da palavra "camarada" nos encontros diplomáticos com os chineses após a ruptura sino-soviética. Leonid Brejnev foi de longe o maior adepto do beijo fraternal, ajudando a produzir uma série de anedotas relativas ao hábito - incluindo-se uma história bem conhecida de que Fidel Castro teria desembarcado do avião já fumando um charuto durante sua visita à União Soviética em 1974, para desencorajar a intimidade excessiva do mandatário soviético.
Após a dissolução da União Soviética e a subsequente "ocidentalização" da cultura russa, o hábito foi abandonado, embora persista ainda hoje entre os cidadãos mais velhos e as populações de regiões mais isoladas da Rússia.
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