O referendo sobre a preservação da União Soviética


Em 17 de março de 1991, nove repúblicas que ainda integravam a União Soviética organizaram um referendo para que os eleitores decidissem sobre a preservação do país. Em todas as repúblicas, o resultado foi categoricamente favorável à manutenção da União Soviética como uma federação. Quase 78% dos eleitores responderam "sim" para a pergunta "você considera indispensável a manutenção da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas como uma Federação renovada de repúblicas iguais e soberanas na qual, sob quaisquer circunstâncias, os direitos e liberdade do cidadão de qualquer nacionalidade serão totalmente garantidos?". Outros 22,1% responderam "não" e 1,9% dos votos foram invalidados. O comparecimento às urnas foi de 80% do contingente de eleitores.

Apesar da vitória esmagadora do "sim", indicando o desejo popular de manter a União Soviética, as lideranças do país prosseguiram com o projeto de desmonte. Desde meados da década de oitenta, Mikhail Gorbachev havia imposto um processo de reformulação do Estado soviético, instituindo os planos de "reestruturação econômica" (Perestroika) e de "abertura política" (Glasnost). Gorbachev quase zerou a cooperação internacional entre a União Soviética e os países do bloco socialista, abriu mão da busca pela hegemonia em conflitos estratégicos, cedeu às pressões dos Estados Unidos e de países ocidentais que demandavam a redução do poderio bélico soviético, dentre várias outras concessões.

As reformas de Gorbachev abriram caminho para o avanço de agendas antissocialistas dentro da própria União Soviética, iniciando um processo de acelerada erosão das bases de sustentação política do país. O acidente com o reator atômico da usina nuclear de Chernobyl, o surgimento de movimentos separatistas nacionais e a eclosão das "revoluções coloridas" em países do Leste Europeu, apoiadas, encorajadas e não raramente orquestradas pelas potências ocidentais, tornaram-se obstáculos difíceis de serem contornados. A crise do bloco socialista na Europa Oriental atingiu seu ápice com a queda do muro de Berlim em 1989, adicionando ainda mais pressão sobre o regime soviético.

As reformas políticas conduzidas por Gorbachev resultaram em ampla insatisfação com o seu governo. Assim, coube a Boris Iéltsin a tarefa de articular o fim do regime, através da criação de uma frente de oposição com os líderes dos países do bloco. Durante o ano de 1991, todas as repúblicas soviéticas se separaram da União - incluindo a própria Rússia. Quinze dessas repúblicas subscreveram o Protocolo de Alma-Ata, criando formalmente a Comunidade dos Estados Independentes (CEI). Os Estados signatários se comprometiam a criar medidas conjuntas para o estabelecimento de economias de mercado e de transição para o capitalismo, encerrando a experiência socialista iniciada 74 anos antes, após o triunfo da Revolução de Outubro de 1917. Por fim, em 26 de dezembro de 1991, Gorbachev oficializava a dissolução do país, promulgando a Declaração nº. 142-H, emitida pelo Soviete Supremo. Em seguida, Gorbachev renunciou ao cargo e Boris Iéltsin assumiu a presidência da Federação Russa.

Oficializada a dissolução da União e a transição das antigas repúblicas socialistas para o capitalismo, todos os países da antiga confederação soviética caíram em uma profunda crise econômica e política. Uma recessão econômica sem precedentes fez o PIB per capita dos ex-soviéticos recuar para os níveis de 40 anos atrás. O coeficiente de Gini quase dobrou, saltando de 0,217 para 0,401. Em duas décadas, o percentual da renda nacional concentrada nas mãos do 1% mais ricos da população saltou de 5% para quase 30%. E o número de pobres vivendo nas ex-repúblicas da União Soviética passou de 14 milhões em 1989 para 147 milhões em 1998. Não por acaso, uma pesquisa realizada pelo Centro Levada, publicada em 2018, registrou que 66% dos russos se dizem "arrependidos" pelo fim da União Soviética.

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