A Revolta de Haymarket e o Dia do Trabalhador
A Revolta de Haymarket, retratada em uma gravura da Harper's Weekly. O sangrento conflito entre trabalhadores e policiais foi o desfecho da histórica greve geral de 1º de maio de 1886, que daria origem ao Dia do Trabalhador.
A segunda fase da Revolução Industrial afetou profundamente o modo de produção e as relações de trabalho nas sociedades ocidentais. A automação substituiu as manufaturas e a produção artesanal, levando à desvalorização da mão de obra. Salários baixos, jornadas extenuantes de até 16 horas diárias, ambientes fabris insalubres e inseguros, exploração da mão de obra infantil e abusos patronais tornaram-se características do trabalho difundidas pelo mundo. As péssimas condições do trabalho provocaram a reação da classe operária, que passou a se organizar politicamente para pressionar por mudanças e valorização da mão de obra.
Em 1864, um grupo de líderes sindicais e intelectuais como Mikhail Bakunin, Karl Marx e Friedrich Engels fundaram em Londres a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) — a Primeira Internacional — organização que reunia os movimentos operários de diversas correntes de esquerda dos Estados Unidos e da Europa. Por meio da atuação da Primeira Internacional, reivindicações como a redução da jornada de trabalho para oito horas diárias, o descanso semanal remunerado e a melhoria das condições de trabalho tornaram-se bandeiras defendidas pela classe operária em todo o mundo.
Encampando as bandeiras da Primeira Internacional, as organizações operárias dos Estados Unidos aprovaram a realização de uma grande greve geral para o dia 1º de maio de 1886. A principal exigência era a adoção da jornada diária de oito horas, sem redução dos salários. Mais de 340 mil trabalhadores de diversas categorias nas principais cidades dos Estados Unidos aderiram à greve, paralisando a produção das fábricas em todo o país. Grandes manifestações foram registradas em cidades como Nova York, Detroit e Milwaukee. A maior mobilização, entretanto, ocorreu em Chicago, então a segunda maior cidade dos Estados Unidos. Estimulados pelas organizações sindicais anarquistas, mais de 40 mil trabalhadores entraram em greve em Chicago e o dobro de pessoas tomou parte nas manifestações de rua.
Os trabalhadores lograram vitórias significativas em várias cidades, estabelecendo acordos com os patrões para a redução da jornada de trabalho. Em Chicago, entretanto, onde predominava o forte reacionarismo do patronato, houve grande resistência à mobilização operária. Porta-voz oficioso do empresariado, o jornal Chicago Times publicava, alguns dias antes da greve, que "a prisão e o trabalho forçado são as únicas soluções para a questão social" e que "o melhor alimento para os grevistas será o chumbo". Com a continuidade dos atos, a imprensa subiu o tom, exigindo das autoridades e das forças de segurança "enérgica repressão" aos grevistas.
Apesar das ameaças, os trabalhadores não se intimidaram. Ao contrário: após o grande ato no dia 1º de maio, as manifestações ganharam crescente adesão de novas categorias. Os operários permaneceram de braços cruzados e voltaram a protestar nas ruas nos dias seguintes. No terceiro dia de protestos, entretanto, a polícia de Chicago cedeu às exigências do patronato e passou a reprimir os trabalhadores. Quando um grupo de grevistas da fábrica McCormick tentou bloquear o acesso de indivíduos contratados pela empresa para furar a greve, policiais armados com rifles e detetives particulares da Agência Pinkerton atiraram contra os manifestantes, matando três trabalhadores.
A repressão policial inflamou os ânimos da classe operária. No dia 4 de maio, uma enorme multidão de trabalhadores compareceu para um protesto na Praça Haymarket. Tentando impedir a realização do ato, a polícia voltou a atacar os manifestantes, mas se deparou com uma vigorosa reação popular — que receberia o nome de Revolta de Haymarket. Os trabalhadores não recuaram, enfrentando os policias com paus e pedras. Em meio ao tumulto, uma bomba caseira explodiu, matando um policial. Iniciou-se uma batalha campal. Sete policiais foram mortos no tumulto e outros 60 ficaram feridos. Em represália, a polícia abriu fogo contra os manifestantes, matando outros quatro trabalhadores e ferindo dezenas.
Após o conflito de 4 de maio na Praça Haymarket, decretou-se estado de sítio e iniciou-se uma dura repressão anti-sindical. Os sindicatos foram fechados e vários grevistas foram detidos. Organizações anarquistas e socialistas sofreram represálias e as redações de jornais operários foram atacadas e saqueadas. A imprensa estadunidense culpou as lideranças sindicais pelo atentado a bomba, em especial os nomes ligados à redação do jornal "Arbeiter-Zeitung".
Nos processos que se seguiram, oito sindicalistas anarquistas foram acusados de conspiração, sob a alegação de que teriam fabricado a bomba lançada contra os policiais. Cinco foram condenados à morte por enforcamento — Albert Parsons, Adolph Fischer, George Engel, August Spies e Louis Lingg — mesmo não existindo qualquer prova contra eles. Lingg cometeu suicídio na prisão. Os outros quatro foram enforcados no dia 11 de novembro de 1887, na data que ficou conhecida como "Sexta-Feira Negra". Outros dois réus foram condenados à prisão perpétua e um terceiro a 15 anos de prisão.
Em 1893, os réus sobreviventes tiveram seus julgamentos anulados e foram libertados com o auxílio do governador de Illinois, John Peter Altgeld, que alegou ter sido o chefe da polícia de Chicago o responsável por organizar o atentado a bomba, de modo a obter uma justificativa para reprimir os grevistas. Em homenagem aos cinco mártires da Revolta de Haymarket, a Segunda Internacional aprovou em 1891, durante o Congresso de Bruxelas, a criação do Dia do Trabalhador, celebrado no dia 1º de maio, como uma data de afirmação da luta de classes e de reivindicação das demandas da classe operária em todo o mundo.
O 1º de maio é celebrado como Dia do Trabalhador em mais de 80 países. No Brasil, mobilizações operárias no dia 1º de maio são registradas desde a década de 1890. A celebração foi transformada em feriado nacional por Artur Bernardes em 1925. Ao longo do século XX, a burguesia tratou de cooptar e neutralizar o caráter político da data, monopolizando as celebrações e substituindo a natureza reivindicatória por festividades anódinas.
Já nos Estados Unidos, palco do episódio que levou à criação da celebração, o Dia do Trabalhador não é comemorado. Incomodada com a origem operária da celebração e sua reivindicação por comunistas, socialistas e anarquistas, a burguesia estadunidense escolheria outra data para sua homenagem — a primeira segunda-feira do mês de setembro. A data é marcada por desfiles encharcados de patriotismo chauvinista e paradas exaltando a importância das profissões. E com uma diferença fundamental: não comemoram o "Dia do Trabalhador", mas o "Labor Day", isso é, o "Dia do Trabalho". Celebram, portanto, o próprio ofício, a exploração da mão de obra, a produção, e não o trabalhador que o exerce.
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