Pedro Castillo
Artigo publicado em 10 de junho de 201:
Vitória da esquerda no Peru: com 99,99% das atas eleitorais processadas, Pedro Castillo é o novo presidente eleito do Peru. Ele superou a candidata de extrema-direita Keiko Fujimori por uma margem estreita de pouco mais de 70 mil votos, totalizando 50,2% dos votos válidos.
Pedro Castillo nasceu em Tacabamba, no departamento de Cajamarca, em 19 de outubro de 1969, em uma família de trabalhadores rurais. Frequentou o ensino primário em uma escola rural de Puña e concluiu a formação básica no Colégio Arturo Osores Cabrera. Na juventude, Castillo tornou-se membro de uma patrulha camponesa — milícias criadas por moradores de regiões rurais que buscavam combater a ação de ladrões e de guerrilheiros do grupo Sendero Luminoso. Bacharelou-se em pedagogia pelo Instituto Superior Octavio Matta Contreras de Cutervo, onde também obteve o título de mestre em psicologia educacional, e passou a atuar como professor do ensino básico. Casou-se com a professora Lilia Ulcida Paredes Navarro, com quem teve dois filhos, Arnol e Alondra.
Castillo ingressou na vida pública como presidente do Comitê de Luta das bases regionais do Sindicato Único dos Trabalhadores na Educação do Peru (SUTEP). Posteriormente, ocupou o cargo de secretário-geral da Federação Nacional dos Trabalhadores na Educação (FENATEP). Em 2002, Castillo concorreu ao cargo de prefeito de Anguía pelo partido social-liberal Perú Posible, mas foi derrotado. Atuou como dirigente do partido em Cajamarca de 2005 até 2017, quando a legenda foi dissolvida.
Castillo liderou a greve dos professores peruanos em junho 2017. O movimento reivindicava reajuste salarial, aumento dos investimentos em educação e a revogação da Lei de Carreira do Professor Público. As paralisações se espalharam pelo país e contaram com ampla adesão da categoria, forçando os governadores a pressionarem as autoridades federais por um acordo. O presidente do Peru à época, Pedro Pablo Kuczynski, convidou uma comissão de dirigentes sindicais para uma negociação, mas excluiu Castillo das conversas, alegando, sem apresentar provas, que o sindicalista teria ligações com o Movimento pela Anistia e Direitos Fundamentais (MOVADEF), organização que militava pela libertação de guerrilheiros senderistas. Castillo negou a acusação e mobilizou suas bases para a continuidade da greve. A paralisação somente foi suspensa três meses depois, após o governo apresentar um decreto atendendo parcialmente as reivindicações.
Em 2020, Castillo se filiou ao Peru Libre, um partido de base marxista-leninista-mariateguista. O partido defende a adoção de uma "economia popular de mercados", tendo o Estado como agente regulador central, como alternativa à agenda econômica neoliberal. A legenda também advoga a descentralização política, a adoção do federalismo, o internacionalismo e o anti-imperialismo. Castillo, entretanto, não se considera um marxista ou socialista, definindo-se genericamente como "progressista". O sindicalista foi escolhido como candidato do partido para a eleição presidencial de 2021.
Durante sua campanha, Castillo criticou o neoliberalismo e defendeu a adoção de um modelo econômico que gire "em torno dos interesses do povo", apresentado sob o lema "já basta de pobres em um país rico". Argumentou em favor do papel do Estado como interventor, planejador e regulador dos mercados, propôs o estabelecimento de programas de redistribuição de renda e uma legislação que desestimule a remessa de lucros para o exterior. Além disso, prometeu a nacionalização do gás natural das reservas de Camisea, a regulamentação da mídia e o aumento massivo dos investimentos públicos em saúde e educação. Por fim, o sindicalista propôs convocar uma Assembleia Constituinte para substituir a Constituição de 1993 — Carta Magna herdada do regime autoritário de Alberto Fujimori, marcado por graves violações dos direitos humanos, repressão brutal e massacres contra a população civil.
Embora influenciada por pautas econômicas progressistas, a plataforma eleitoral de Castillo foi marcada pela ambivalência, com acenos ao mercado e a incorporação de elementos morais conservadores. O candidato se comprometeu a respeitar a propriedade privada, a garantir o cumprimento dos contratos e buscou se dissociar de vínculos ideológicos com o chavismo e com as nações socialistas, reafirmando a necessidade de enfoque na construção de um projeto nacional. Na pauta de costumes, Castillo buscou alinhamento com o perfil da população camponesa peruana, bastante religiosa. Expressou oposição à legalização do aborto e à eutanásia e rejeitou a instituição do casamento entre pessoas do mesmo sexo e o ensino sobre igualdade de gênero. Por fim, fez uso recorrente do discurso anticorrupção.
Com 19% dos votos, Castillo conquistou a dianteira no primeiro turno da eleição presidencial, seguido por Keiko Fujimori, candidata do partido conservador Fuerza Popular e herdeira do projeto político autoritário inaugurado em 1990 por seu pai, Alberto Fujimori. Investigada por corrupção e ligações com o crime organizado, Keiko chegou a ser presa em 2020, mas foi libertada sob fiança três meses depois. Durante sua candidatura, prometeu governar o país "com mão de ferro" e instituir o que chamou de "demodura", neologismo combinando as palavras democracia e ditadura.
Apesar do histórico atribulado — que se estende ao marido, também preso por lavagem de dinheiro — Keiko recebeu apoio massivo da imprensa, das elites e das classes médias do Peru, incluindo os liberais antifujimoristas, alarmados pelas propostas de Castillo. Não obstante, o sindicalista logrou uma vitória apertada. Keiko reagiu alegando fraude eleitoral e exigindo a recontagem de meio milhão de votos, ao passo que Castillo pediu ao seu eleitorado que permaneça vigilante com eventuais intentos golpistas. A reação de Keiko sinaliza que Castillo terá trabalho para garantir a governabilidade em um país marcado pelas instabilidade política e servido por um congresso dominado por parlamentares conservadores.
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