Museu Nacional
Fundado no Rio de Janeiro em 6 de junho de 1818, o Museu Nacional é a mais antiga instituição científica do Brasil. O museu se destacou desde o século XIX por seu vasto e precioso acervo — o maior da América Latina em história natural e antropologia. Seu acervo englobava mais de 20 milhões de peças, subdivididas em coleções de geologia, paleontologia, botânica, zoologia, antropologia biológica, arqueologia e etnologia. Não obstante, em 2 de setembro de 2018, pouco tempo após as comemorações do bicentenário do museu, um incêndio devastador destruiu mais de 90% do acervo e os ambientes históricos de sua sede, o Palácio de São Cristóvão.
O Museu Nacional é o sucessor das coleções amealhadas pela Casa de História Natural, a chamada de "Casa dos Pássaros" — gabinete de ciências naturais fundado no Rio e Janeiro em 1784 pelo Vice-Rei Dom Luís de Vasconcelos e Sousa, seguindo ordens da rainha de Portugal, Dona Maria I. A instituição abrigava amostras das "riquezas da terra" e fora fundada em um contexto de valorização do estudo das ciências e da história natural, refletindo a consolidação dos ideais iluministas. A Casa de História Natural era um entreposto de produtos naturais, onde eram selecionados e armazenados itens representativos da flora e fauna brasileira que seriam posteriormente remetidos a Portugal e incorporados ao acervo do Museu Real de Lisboa.
Em 1808, fugindo das invasões napoleônicas na Europa, a corte portuguesa se transferiu para o Brasil. Com isso, a Casa de História Natural perdeu sua função de entreposto e foi extinta por decreto do príncipe regente Dom João VI. Por outro lado, a transformação do Rio de Janeiro em sede do governo imperial português gerou a necessidade de modernização das antigas instituições coloniais e de criação de novas organizações, aptas a atender as demandas de uma potência ultramarina — instituições que viabilizassem a estadia da família real portuguesa no Brasil e que fornecessem os elementos necessários ao projeto político do império português. Assim, Dom João VI ordenou a criação de uma série de órgãos públicos: Banco do Brasil, Imprensa Régia, Academia Militar, Real Biblioteca, Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica, Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, Teatro Real, Horto Florestal e, por fim, o Museu Nacional.
Criado por decreto em 6 de junho de 1818, sob a denominação original de "Museu Real", a nova instituição teve como primeira sede um edifício no Campo de Santana (atual Praça da República). O decreto definia como objetivo do museu "propagar os conhecimentos e estudos das ciências naturais no Reino do Brasil, que encerra em si milhares de objetos dignos de observações e exame". A instituição foi criada seguindo um partido museológico generalista, típico dos "gabinetes de curiosidades" europeus. O museu herdou as coleções zoológicas e botânicas da Casa de História Natural, mas também abrigou artefatos arqueológicos, itens etnográficos, manuscritos, mobiliário histórico, obras de arte e a preciosa Coleção Werner — o primeiro acervo mineralógico moderno do mundo, reunido por Abraham Gottlob Werner e adquirido pela coroa portuguesa ainda no século XVIII.
Rebatizado como "Museu Imperial" após a independência do Brasil em 1822, o museu teve seu acervo ampliado por iniciativa de Dom Pedro I, que repassou à instituição uma série de coleções científicas e antropológicas — nomeadamente o valioso acervo egípcio adquirido em 1826 junto ao negociante italiano Nicolau Fiengo. A política de depósito de itens científicos coletados por missões estrangeiras, instituída pelo ministro José Bonifácio, também ajudou a enriquecer a coleção. O museu criou laboratórios de química e física e iniciou atividades de permuta com instituições estrangeiras. Na década de 1830, o Museu Imperial já figurava entre os principais museus de história natural do mundo. Inaugurou seu herbário e sua biblioteca e deu início a uma série de expedições científicas, coletando artefatos arqueológicos, etnográficos e itens naturais nos biomas setentrionais do Brasil.
Durante o reinado de Dom Pedro II, o museu, sob gestão de Ladislau Netto, conheceu um de seus períodos mais fecundos, iniciando sua "era de ouro". Instituiu uma política museológica consistente, com exposições e atividades educativas, implementou os cursos públicos e lançou a primeira publicação científica especializada em ciências naturais do Brasil — os Archivos do Museu Nacional, para o qual colaboraram nomes como Charles Darwin, Armand de Quatrefages e Claude-Henri Gorceix. Também tornou-se depositário do acervo coletado pela Comissão Geológica do Império, dirigida por Charles Frederick Hartt. Em 1882, a instituição inaugurou a Exposição de Antropologia, reunindo um dos maiores acervos de artefatos pré-colombianos da América do Sul.
Após a proclamação da República, o museu agregou ao seu acervo as coleções de Pedro II e Teresa Cristina, desapropriadas pelo novo governo. As coleções abrangiam vasto material científico e histórico, incluindo desde exsicatas de espécimes raras até importantes artefatos egípcios e peças greco-romanas. Renomeado "Museu Nacional", a instituição foi transferida para o Palácio de São Cristóvão, antiga residência da família imperial localizada na Quinta da Boa Vista. O diretor João Baptista Lacerda conduziu as obras de adaptação, criando novas salas e galerias e instalando laboratórios científicos, mas preservando a ambientação de alguns cômodos — as chamadas "Salas Históricas". O museu consolidou seu papel como instituição de ensino e pesquisa nas primeiras décadas do século XX, amealhou novos acervos relevantes (nomeadamente a coleção da Comissão Rondon) e lançou novos periódicos científicos ("Boletim do Museu Nacional"). A década de vinte foi marcada por uma série de visitas de personalidades ilustres. Em 1925, o museu foi visitado pelo físico alemão Albert Einstein. No ano seguinte, recepcionou a pesquisadora polonesa Marie Curie e sua filha, Irène Joliot-Curie. Em 1928, foi a vez de Santos Dumont, que testou a decolagem de um modelo de autopropulsão no pátio do museu.
Nas décadas seguintes, o museu experimentou um período prolífico, reunindo parte substancial dos grandes nomes da ciência brasileira em seus quadros. Trabalharam na instituição Bertha Lutz, Roquette-Pinto, Alberto Betim Paes Leme, Heloísa Alberto Torres, Augusto Ruschi, Luís de Castro Faria, Raimundo Lopes e Edison Carneiro, entre muitos outros. Em 1937, foi fundada a Sociedade dos Amigos do Museu Nacional (SAMN), integrada por membros afluentes como Guilherme Guinle, Mariano Procópio e Eduardo May. Com recursos doados pela SAMN, o museu adquiriu uma área de 129 hectares de Mata Atlântica no município de Santa Teresa, no Espírito Santo, posteriormente convertida na Estação Biológica Santa Lúcia. Obtendo crescente visibilidade internacional, a instituição agregou ao seu corpo de funcionários uma série de pesquisadores estrangeiros renomados: Claude Lévi-Strauss, Ruth Landes, Charles Wagley, etc. Em 1946, o museu foi vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A filiação permitiu ao museu intensificar os trabalhos de pesquisa e facilitou os vínculos com a comunidade acadêmica, mas também resultou em restrição significativa de sua autonomia.
A partir da década de sessenta, o museu atravessou um prolongado período de crise financeira e dificuldades institucionais. A mudança da capital federal para Brasília impactou negativamente na visibilidade da instituição. Paralelamente a isso, o golpe de 1964 e a subsequente ditadura militar instauraram novos protocolos de incentivo a ciência, marcados pela descentralização e especialização em setores tidos como "prioritários". O museu sofreu sucessivos cortes em seu orçamento, ao passo que a comunidade acadêmica ligada ao órgão sofreu uma severa campanha persecutória. Em consequência, o museu foi sucateado e sofreu sensíveis limitações à sua atuação como instituição científica. O último presidente a visitá-lo foi Juscelino Kubitschek.
Ao término do regime militar, o Museu Nacional estava com seu prédio totalmente deteriorado e seu funcionamento era precário. Algumas de suas salas estavam fechadas há 16 anos e praticamente todos seus laboratórios estavam inativos. Os governos dos anos, noventa, entretanto, pouco fizeram para reerguer o museu, que seguiu enfrentando severas dificuldades financeiras. O congelamento do orçamento das universidades federais imposto por Fernando Henrique Cardoso teve impacto extremamente negativo sobre a instituição, afetada por repasses cada vez menores da UFRJ. A partir do governo Lula, os repasses orçamentários aumentaram significativamente, o que possibilitou ao museu conduzir uma série de projetos de revitalização. Em 2006, Fernando Haddad, então Ministro da Educação, incluiu o museu no Projeto de Preservação das Coleções Científicas, liberando verbas para restauração do acervo e higienização da coleção bibliográfica. Com apoio da Petrobras, o Museu Nacional construiu um anexo e reformulou as exposições permanentes de arqueologia e etnologia. O edifício, entretanto, não passou por restauração, e seguiu apresentando sinais visíveis de má conservação, com paredes descascadas e fios elétricos expostos.
A partir de 2014, o museu enfrentou sucessivos cortes orçamentários e em 2015 chegou a fechar as portas por alguns dias em função do atraso dos repasses. De 2016 em diante, as verbas do museu sofreram uma redução abrupta, sobretudo após a aprovação da Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos — a PEC da Morte, que estabeleceu o "novo regime fiscal", congelando os investimentos públicos por 20 anos. Entre 2013 e 2018, o museu teve uma redução de 90% do orçamento, que despencou de 520 mil reais anuais para meros 54 mil reais. Sem verbas para sustentar suas atividades básicas, o museu praticamente zerou os investimentos na manutenção do edifício, levando a uma deterioração severa das suas instalações. Em 2 de setembro de 2018, o museu foi destruído por um incêndio de grandes proporções, causando uma perda inestimável para o patrimônio museológico nacional. Mais de 90% do acervo científico da instituição se perdeu, incluindo as maiores coleções mundiais de arqueologia pré-cabralina e etnologia dos povos indígenas sul-americanos.
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