O ataque ao carro de Nixon na Venezuela


Manifestantes atacam o carro de Richard Nixon, então vice-presidente dos Estados Unidos, durante sua visita a à Venezuela. Caracas, 13 de maio de 1958.

Eleito vice-presidente dos Estados Unidos na chapa encabeçada por Dwight D. Eisenhower, o republicano Richard Nixon organizou uma série de visitas oficiais aos países da América do Sul em 1958. O objetivo era fortalecer as relações intra-hemisféricas e consolidar a presença do país na região, como parte da estratégia de contenção — política estadunidense que visava neutralizar a influência internacional da União Soviética e da esquerda radical. O restabelecimento dos laços diplomáticos entre a União Soviética e os países sul-americanos e a assinatura de novos acordos comerciais entre as nações do continente e o bloco socialista, em um contexto marcado pela queda nos preços das commodities nos mercados internacionais, eram vistos como sinais alarmantes por Washington.

Nixon pretendia visitar todos os países independentes da América do Sul, com exceção do Brasil e do Chile. O Brasil já fora visitado pelo estadunidense no ano anterior, ao passo que o mandatário chileno, Carlos Ibáñez del Campo, estaria fora do país na ocasião. A turnê diplomática foi bem tranquila nas paradas iniciais. Com exceção de alguns pequenos protestos isolados, Nixon foi bem recebido no Uruguai, na Argentina, no Equador e na Colômbia. O primeiro contratempo da viagem surgiu no Peru. Ao visitar a Universidade de San Marcos, em Lima, o estadunidense foi recebido por um grande protesto estudantil. Os peruanos jogaram pedras na comitiva dos Estados Unidos, forçando Nixon a se retirar. A agenda oficial foi retomada no dia seguinte e Nixon compareceu à praça central da cidade para depositar uma coroa de flores na estátua de Simón Bolívar, diante de uma amigável multidão de cerca de 1.000 pessoas.

A próxima parada de Nixon, entretanto, era a Venezuela, onde o clima não era nada agradável. No início do ano, o ditador venezuelano Marcos Pérez Jiménez havia sido derrubado após um massivo levante popular. General do exército, Pérez Jiménez assumira o poder através de um golpe militar e fez uma das gestões mais impopulares da história do país, marcada pela perseguição política dos opositores e severa repressão à população. Pérez Jiménez era, entretanto, fortemente apoiado pelo governo dos Estados Unidos, que lhe oferecera asilo político logo após sua deposição. Os estadunidenses também haviam condecorado o ditador venezuelano com a Legião de Mérito, ao mesmo tempo em que teceram críticas a Wolfgang Larrazábal, chefe do governo provisório, que pretendia ser candidato à presidência na eleição superveniente, apoiado por uma coalizão de partidos — incluindo o Partido Comunista da Venezuela (PCV).

Tamanho era o incômodo com as ações do governo estadunidense que o Conselho Municipal de Caracas chegou a aprovar uma resolução declarando Richard Nixon como "persona non grata". O chefe da CIA na Venezuela aconselhou Nixon a cancelar a viagem ao país, mas o estadunidense considerou a recomendação exagerada e alarmista. Não precisou esperar muito para notar que estava errado. Pouco após desembarcar no Aeroporto de Maiquetía, Nixon seguiu em comboio até Caracas para dar início à agenda oficial. Assim que o trânsito pesado da capital venezuelana forçou o veículo onde estava Nixon a desacelerar, populares cercaram o automóvel e começaram a hostilizá-lo. Jogaram ovos e pedras e golpearam o automóvel com murros e pedaços de pau, amassando a lataria e estilhaçando os vidros. Em seguida, começaram a chacoalhar o automóvel, tentando virá-lo.

Os seguranças de Nixon sacaram as armas e se prepararam para atirar nos manifestantes, mas foram contidos pelo vice-presidente, que alegou que disparos apenas enfureceriam a multidão, grande demais para ser contida. Batedores que acompanhavam a comitiva e uma camionete do serviço de imprensa do governo estadunidense abriram caminho em meio aos populares, bloqueando o acesso ao veículo. Alertados, os militares venezuelanos dispersaram os manifestantes, permitindo à comitiva de Nixon seguir viagem até a Embaixada dos Estados Unidos em Caracas. A chancelaria estadunidense foi cercada pelo exército venezuelano e pela guarda dos fuzileiros navais. Informada sobre o ocorrido, a Casa Branca criticou o que chamou de "o ataque mais violento já perpetrado contra um alto funcionário americano em solo estrangeiro".

A resposta foi histérica. O presidente Eisenhower ordenou o envio do porta-aviões USS Tarawa para o litoral venezuelano, acompanhado por oito contratorpedeiros e dois navios anfíbios de assalto. A 2ª Divisão da Marinha e a 101ª Divisão Aerotransportada também foram mobilizadas e ficaram em alerta para efetuar uma eventual operação de invasão. A turnê sul-americana de Nixon foi cancelada e o vice-presidente retornou aos Estados Unidos dois dias após o incidente. A imprensa estadunidense reagiu com indignação ao que classificou de "violento ataque desencadeado pelos comunistas", em reportagens que variavam da adulação pela "atitude exemplar" de Nixon às exigências raivosas de uma declaração de guerra contra a Venezuela, a despeito dos repetidos pedidos de desculpas feitos pelas autoridades sul-americanas.

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